Eu tenho observado há alguns meses que algumas práticas do dojo andam meio que passando uma visão incorreta sobre TDD, e não é só por causa das cascatas de ifs. Nada melhor que exemplos para mostrar o que quero dizer. Em TDD/BDD/whatever no mundo real, ninguém vai escrever um teste:
it 'dois mais dois é igual a quatro' do
...
end
ou
def test_quatro_nao_e_um_numero_feliz(self):
...
Nestes códigos, o nome do método é a expectativa. Em TDD, uma expectativa, é o resultado que se espera que ocorra na execução do teste, seja uma expectativa padrão como
order.clear |should| change(order.item_count).by(-3)
ou uma verificação de mock como MailService.should_receive(:send).with("sos@batcave.com")
.O nome do método de teste (ou a sua descrição, no caso do RSpec) não é e nem pode ser a expectativa, pelo menos a se julgar pela literatura de TDD. O nome do método de teste é o nome de uma responsabilidade da classe (o "test method names should be sentences" que é tão enfatizado em BDD).
O correto seria:
it 'soma dois números' do
...
end
ou
def test_identifica_numeros_infelizes(self):
...
Em todos os casos, o nome dos métodos é uma descrição abstrata - no sentido de não trazer exemplos concretos - e as expectativas com seus valores objetivamente verificáveis vêm no interior dos métodos de teste. Ou seja, em TDD, cada método de teste representa algo que a classe é capaz de fazer e não infinitas variações de valores passados a uma mesma funcionalidade. No fim das contas, a expectativa acaba sendo escrita duas vezes: uma vez no nome do método e outra na expectativa propriamente dita. A questão aqui não é o uso ou não de baby steps, mas uma formulação de testes que é conceitualmente diferente daquela utilizada na literatura de TDD.
Veja um exemplo, do livro "Growing Object-Oriented Software, Guided By Tests", de Steve Freeman e Nat Pryce (Addison-Wesley, 2009):
public class CatalogTest {
private final Catalog catalog = new Catalog();
@Test
public void containsAnAddedEntry() {
Entry entry = new Entry("fish", "chips");
catalog.add(entry);
assertTrue(catalog.contains(entry));
}
@Test
public void indexesEntriesByName() {
Entry entry = new Entry("fish", "chips");
catalog.add(entry);
assertEquals(entry, catalog.entryFor("fish"));
assertNull(catalog.entryFor("missing name"));
}
}
Neste código, os testes são:
- contains an added entry
- indexes entries by name
Ou seja, são responsabilidades abstratas e não exemplos concretos.
Kent Beck, em seu cĺássico "Test-Driven Development By Example" (Addison-Wesley, 2003), vai na mesma linha: seus testes na classe
Money
que foi citada no post se chamam "multiplication", "equality", "currency". Ou seja, nada de "twoDollarsPlusThreeDollarsEqualFiveDollars".Outra referência de TDD que gosto bastante, "Test Driven: TDD and Acceptance TDD for Java Developers", de Lasse Koskela (Manning, 2007), também segue a mesma ideia. Este livro, por sinal, tem disponiblizado o segundo capítulo para download, contendo um excelente exemplo de baby steps que vale mesmo a pena ser lido. Neste exemplo, novamente, os testes são "unknownVariablesAreIgnored", "multipleVariables" ou "missingValueRaisesException". Novamente, nada de expectativas nos nomes dos testes.
Certamente, não há "culpados" por isto, e também é provável que muitos não vejam assim tanto problema no que expus. Coding dojos são dinâmicos e não hierárquicos por definição, portanto evoluem e se alteram com o tempo e com o contato de diferentes pessoas. Assim, o "desvio" de TDD pode até não ser um problema em si, afinal o coding dojo é um jogo, mas temos que perceber que estamos praticando sob o nome de TDD uma coisa que não é exatamente TDD. E, na verdade, estamos praticando e aprendendo, uma vez que o coding dojo, pelo menos aqui no RJ, tem sido visto como ferramenta de aprendizado de programação. Quando o desenvolvedor está consciente que nos dojos é praticada uma variação do TDD, tudo bem. Porém, no caso de um iniciante, nós temos, sim, um problema, pois as pessoas vão aprender como TDD algo que poderia até mesmo ser considerado um antipattern.
Talvez pelos problemas utilizados em dojos serem bastante simples, muitas vezes com apenas uma feature, a única forma de ter mais de um método de teste acaba sendo a fatoração das classes de teste por expectativas e não por features. Na verdade, não sei nem se isto é um problema para todo mundo. Pessoalmente, é algo que não gosto e que me incomoda, me soa como se o código estivesse pulando e gritando "ei, eu estou errado, você não está vendo?". Mas é o meu ponto de vista. E aí, qual é o seu?